Segunda-feira à noite, uma tempestade brutal caía com rajadas de vento.
Eu e meus irmãos decidimos cometer o ato mais insano e impulsivo possível naquele momento, simplesmente porque podíamos, resolvemos subir a serra, a torre da cidade, uma estrada de terra encharcada, cheia de brejo, no frio cortante, debaixo da chuva.
Subíamos curvados, exaustos, com o fôlego já no limite, iluminando o chão de lama, galhos retorcidos, pedras afiadas e sapos pulando.
Avançávamos pela colina imersa em um breu absoluto um escuro profundo. Lá em baixo a silhueta de um prédio gigantesco do antigo hospital, arquitetura esquecida, construído para tratar tuberculosos. Mais adiante, encontramos um ferro-velho onde paramos para respirar; a subida seguinte seria ainda mais cruel, mais inclinada. Inspirávamos como se tentássemos arrancar energia do próprio ar.
Vimos uma casa iluminada por uma luz amarela quase incandescente, como tochas, inalcançável a última casa da trilha.
Um de nós pegou um sapo na mão, celebramos sua ousadia.
Subimos, finalmente, até a torre o ponto mais alto de toda a região. A vista alcançava cidades, serras e vales. As estrelas tentavam brilhar acima, as luzes da cidade tremeluziam abaixo, no fundo, mas tudo estava coberto por nuvens negras que se moviam como criaturas viva. Sentamos nas pedras, no chão molhado, como ruínas antigas. O vento batia com força. Estávamos encharcados, com o frio rasgando a pele, e sentíamos as pontas dos dedos queimarem de dor.
Ninguém lembrava mais de onde vinha aquela ideia absurda. Não sabíamos por que fizemos aquilo. Só parecia um impulso sem lógica e nós ríamos de nós mesmos. Tínhamos abandonado nossas regras, nossas rotinas apenas para tocar algo diferente da vida comum.
Nunca estivemos tão vivos quanto naquela noite. Pela mistura de medo, loucura, beleza e exaustão, percebi: estávamos ali, inegavelmente vivos.